"Encamisamento" pode salvar prédio
Apesar do risco de desabar, engenheiros acham que os pilares podem ser recobertos com concreto
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O Edifício Olinda, na Avenida Mário Melo,
Segundo o diretor de Engenharia da Codecir, Ronaldo Santos, a ordem para a desocupação imediata do prédio tem mais força que a interdição em si, que é uma medida administrativa tomada pela Dircon. Quando todos os moradores deixarem o prédio, ele será lacrado para recuperação e só deverá ser liberado quando cessar o risco de queda, que é potencial. Isso quer dizer que existe a possibilidade de o prédio cair se não forem tomadas as medidas emergenciais. “Se fosse um risco iminente, teríamos mandado todos saírem em poucas horas, inclusive os vizinhos, porque o prédio poderia ruir a qualquer hora. Vamos insistir com o condomínio para não alcançarmos esse estágio. Com a saída dos moradores e a retirada dos móveis, o prédio ficará mais leve”, esclareceu.
O síndico do edifício Olinda, Hugo Reis, disse que o condomínio está aguardando a saída completa dos moradores para dar início à obra. Apesar da urgência, o condomínio só conseguiu os recursos para a primeira parte do serviço. “A princípio, será feito um escoramento. Estamos conversando com os proprietários e, até agora, ninguém que foi ouvido se negou a colaborar”, disse. A situação mais crítica foi encontrada nos três andares superiores: 15º, 16º e 17º, que estão com problemas graves na laje, pilares e vigas expostas e enferrujadas.
Segundo o engenheiro civil calculista Cláudio Mota a solução do “encamisamento” é viável. “É uma solução que interfere na arquitetura do prédio. Os pilares ficarão maiores e mais visíveis. É um defeito estético, mas necessário para proteger a vida do edifício”, analisou. A execução desse trabalho, quando não é interrompido, costuma durar cerca de seis meses.
O Edifício Olinda tem 40 anos, 17 andares e 80 apartamentos. Até ontem, a Codecir contabilizou que 34 famílias tinham deixado o imóvel. O casal Ermelinda Marinho, 77, e Juraci Domingos, 76, partiu ontem para um apartamento que conseguiu alugar no Ipsep. Foi difícil despedir-se do imóvel próprio, dos amigos e da vista do Rio Capibaribe. “Foi essa paisagem que nos conquistou. Agora, estamos tendo que deixar nosso único bem”, disse Ermelinda
Vizinhos receosos
Do portão de casa, a aposentada Maria de Lourdes Nogueira, 75 anos, olhava apreensiva para a paisagem ao lado. Há 57 anos morando na Travessa do Costa, acompanhou a construção do Edifício Olinda, que fica quase em frente à residência dela. Desde que soube da notícia de que o prédio corre risco de desabar, não pensa em outra coisa que não seja a mudança de endereço. “Desde o fim de semana que penso em sair”, disse.
Quem vive ou trabalha nos arredores passou a conviver com a dúvida.“O pessoal está aflito porque não sabe das reais condições desse prédio e se ele pode afetar a gente”, disse Dayse Figueiredo, 30, recepcionista da Escola de Contas Públicas, que fica ao lado do prédio. O comerciante Paulo Albuquerque, 55, tem uma loja de conveniência no terreno do prédio. “Ninguém disse nada e estou bastante apreensivo com os boatos”, disse. O diretor de Engenharia da Codecir, Ronaldo Santos, afirmou que nenhum prédio da vizinhança será interditado, apenas a loja de conveniência e um restaurante que estão na área do Olinda.
Drama de ficar sem teto
Do passado, muitos não querem nem falar. O drama de quem viveu de perto o desabamento ou a condenação do próprio imóvel é o mesmo. Vem acompanhado de busca pela justiça e um difícil recomeço de vida.Os moradores do Edifício Areia Branca, que desabou em 2004, em Piedade, por exemplo, lutaram muito para ter parte dos direitos de volta. No final do ano passado, a Justiça determinou que cada uma das 24 famílias deveria receber cerca de R$ 200 mil da seguradora. Nos dias de hoje, um apartameto do Areia Branca valeria R$ 350 mil, valor acima do seguro pago. No desabamento, morreram quatro pessoas.
“Você quer falar sobre esse assunto que a gente não gosta de lembrar?”, questionou uma mulher que morou no Edifício Enseada de Serrambi,
Advogado dos moradores do Edifício Éricka, que também desmoronou, em Olinda, matando quatro pessoas e ferindo outras 11, Roberto Domingues, informou que todas as pessoas que entraram na Justiça conseguiram receber um imóvel ou o valor referente à compra de um novo.
Um dos últimos episódios envolvendo danos sérios em prédios da RMR aconteceu, em 2009, com o Conjunto Residencial Boa Viagem. Hoje, o cenário é de abandono de dois blocos. Os moradores contrataram advogados que entraram com várias ações na Justiça. Para os moradores do conjunto, por enquanto, restam auxílios para o pagamento do aluguel. “O valor está muito defasado”, queixou-se o síndico Frederico Wanderley. O professor universitário aposentado Marco Caneca, 70, que também morou no conjunto, hoje vive na Madalena. A sua história ficou conhecida quando, em meio à desocupação, ele tocou um piano, emocionando os moradores. “Passei vinte anos pagando o apartamento para ver tudo desaparecer em horas”, lembrou ontem.
Problema é a manutenção
Estado não tem lei que obrigue vistorias e reparos nos edifícios. Cuidados ficam nas mãos dos próprios condôminos
O Recife, que já tem uma tradição histórica de edificações seculares, começa a enfrentar os problemas da meia-idade nos prédios da arquitetura moderna. E a doença é uma só: falta de manutenção. Pernambuco não dispõe ainda de uma legislação que torne obrigatória a manutenção dos prédios. A lei nº 13.032/06, que trata da vistoria e manutenção predial, nunca foi sancionada. Na prática, as obras de manutenção dependem do entendimento e boa vontade dos próprios condôminos. A indicação, na regra geral, é fazer a manutenção a cada cinco anos. Ninguém cumpre isso. Não há quem cobre.
A convite do Diario, o engenheiro e vice-presidente do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea), Sérgio Dias visitou um prédio de 35 anos, no bairro da Boa Vista. O bloco A do Edifício Timbira teve a sua última reforma há dez anos e já mostra sinais de degradação. O engenheiro apontou alguns problemas como infiltração e ferragens expostas em quatro vigas da garagem do prédio. “A ferragem exposta é sinal de problema. Houve uma oxidação e o ferro acabou estourando o concreto. Seria pior se fosse nos pilares”, explicou. Segundo o engenheiro com a manutenção correta, isso pode ser resolvido.
O síndico do prédio, Roberto Dias, acompanhou a vistoria não oficial do engenheiro do Crea. Segundo ele, o condomínio já está fazendo um rateio para realizar a manutenção. “Quando houve o desabamento dos prédios no Rio de Janeiro, nós ficamos preocupados. Fiz uma reunião falando da necessidade de arrecadar recursos para a obra de recuperação e o rateio já está sendo feito”. De acordo com o engenheiro do Crea, os síndicos deveriam fazer cursos de capacitação. “Os condomínios só se preocupam em pagar as taxas do prédio e dos empregados. Nunca estão preparados para os problemas. Não há um fundo permanente de manutenção e quando surge um dano não há dinheiro”.
Foi em 2006, após a queda do Edifício Areia Branca, em 2004, que foi elaborada a Lei Estadual de Manutenções Prediais. A legislação serviria de suporte para implantar a cultura da manutenção, mas não está
Segundo o professor, o primeiro passo é garantir uma legislação que dê suporte aos órgãos para aplicar a lei. “Sem a sanção da lei, não há a operacionalização das atividades. Hoje não existe um órgão público com essa função”, disse. Pela lei, que não foi sancionada, a manutenção para prédios com até 20 anos deveria ser feita em um período de 20 anos. Nos prédios acima de 20 anos, a cada três anos. Já nas edificações onde há uma grande circulação de pessoas, a exemplo dos shoppings, esse prazo cai para dois anos. “O instrumento da legislação é importante.
Concreto substituiu tijolos
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A arquitetura moderna no Recife teve início na década de 1940. Antes disso, já tínhamos edifícios como o Independência, na Praça da Independência, de
Para o arquiteto e professor do departamento de pós-graduação da UFPE, Fernando Diniz, em matéria de concreto ainda estamos engatinhando. “É uma técnica relativamente jovem com cerca de 50 anos. E não se trata de um material e sim de uma técnica. É uma junção de vários materiais: areia, brita, cimento e ferro e esses materiais podem ter reações diferentes ao longos dos anos e do ambiente em que se encontra”.
O episódio do desabamento do Edifício Areia Branca, em Piedade, Jaboatão, em 2004, foi mais uma vez lembrado. A perícia constatou que houve problemas no concreto. A umidade no solo provocou reações e danificou o material, que entrou em colapso. “Toda construção tem que ter um plano de manutenção. Não fazemos isso e os problemas se acumulam. Há situações que podem ser revertidas. Outras não, como o Areia Branca”, lembra.
O engenheiro e vice-presidente do Crea, Sérgio Dias também mencionou o Areia Branca. “A nossa região já tem problema da maresia e imagine o concreto em um ambiente úmido, como aconteceu com o Areia Branca. Um colega que teve acesso ao prédio e contou que em alguns pilares não havia mais concreto no subsolo, só as ferragens. Eram palitos segurando uma estrutura gigantesca”.
Já o professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Paulo Helene, chamou atenção da responsabilidade sobre a segurança das obras civis. Segundo ele, documentos internacionais como os adotados na Europa e nos EUA exigem inspeções técnicas de edifícios a cada 10 anos, no máximo. No caso de obras de maior importância, a inspeção técnica deve ser realizada a cada