Programa vai debater e apresentar soluções para a inclusão social dos catadores de material reciclável com o fim dos lixões
A reciclagem de resíduos sólidos vai além da proteção do meio ambiente. Ela é uma catalisadora de emprego e renda. Só para ter uma ideia do cenário, estima-se que no Brasil, exista mais de 1,5 milhão de catadores e catadoras vivendo somente dos 2% dos materiais coletados nas ruas, lixões e um percentual menor via programas de coleta seletiva. Em contrapartida, o potencial da reciclagem no Brasil é de 40% dos resíduos gerados, conforme informações da Carta dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis.
O documento é o resultado do 1º Encontro Estadual de Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis, realizado em 30 de maio passado, no Recife. Ele contém 23 itens considerados fundamentais para a execução do trabalho e do acesso a condições dignas de vida a estes profissionais.
Essa preocupação, principalmente com a implantação de grandes unidades de triagem eletromecânicas nas Centrais de Tratamento de Resíduos (CTR) na Região Metropolitana do Recife, sem a devida atenção dos setores públicos e privado com o problema da inclusão social dos catadores, é pauta do Crea Convida desta terça-feira (22).
Sob o tema “Reciclagem e Sustentabilidade”, o programa vai contar com a presença do coordenador nacional do Movimento Nacional Eu Sou Catador, Sebastião Santos, conhecido como Tião Santos, e Daniel Pernambucano, advogado, especialista em Direito Ambiental e agente de Defesa Ambiental na Associação Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (Ancat), como palestrantes. Também estará Bertrand Sampaio de Alencar, engenheiro civil, mestre e doutor em Desenvolvimento Urbano, especialista em Resíduos Sólidos e assessor da Presidência do Crea-PE, como debatedor.
Filho de Carlos, um estivador do Cais do Porto e de Geruza, que por vinte e cinco anos trabalhou em Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, o maior aterro sanitário da América Latina, Tião Santos conhece muito bem a realidade de quem sobrevive do que é retirado do lixo. Penúltimo filho de um total de oito, ele também trabalhou no Gramacho e foi exatamente por lá que um dia encontrou no lixo o livro “O Príncipe”, de Nicolau Maquiavel.
A publicação abriu as portas para o pensamento humano e político e o fez buscar novas leituras, como Friedrich Nietzsche, além de se interessar por sociologia. A grande mudança na sua vida aconteceu quando o artista plástico Vick Muniz procurou os catadores de Gramacho para montar uma série de quadros a partir de objetos coletados no aterro, usando os catadores como assistentes e filmando todo o processo artístico.
O trabalho, realizado em 2007, resultou num documentário aclamado pela crítica e pelo público, ganhando importantes prêmios no Festival de Berlim, no Festival de Sundance, além da indicação de melhor documentário no Oscar de 2011. A visibilidade de “Lixo Extraordinário” revelou, para milhões de pessoas, a situação dos catadores de Jardim Gramacho e os problemas que o fechamento do lixão irá provocar para milhares de pessoas que tiram o seu sustento do lixo. Para divulgar o documentário, Tião Santos viajou para a Alemanha, Espanha, Estados Unidos, Coreia, Inglaterra e conheceu a realidade de outros países, a vida dos catadores, o processo de reciclagem nas cidades e as políticas públicas que envolvem o lixo.
“Vou abordar na minha apresentação as questões econômicas e sociais, além das ambientais, que envolvem os catadores de material. Itens como a valorização do profissional e a execução de políticas públicas para a inclusão social dos catadores”, observa Tião Santos. Ele destaca que já existe a Política Nacional de Resíduos Sólidos, com a Lei 12.305/10, que reconhece a valorização do trabalho dos catadores de materiais recicláveis na condição de protagonistas da reciclagem no Brasil. Mas sua baixa adesão contribui para preservar o estado de pobreza, exploração e vulnerabilidade vivenciados pelos catadores e catadoras no Brasil.
“O catador presta um serviço à sociedade, mas não é remunerado. Eles são peças fundamentais na reciclagem, mas não recebem por isso. Eles só recebem pela venda do material. Esse valor, para a indústria, é considerado lucro, não remuneração”, pontua Daniel Pernambucano. O advogado destaca que uma mudança na legislação equipara os catadores às indústrias de recicláveis, com prejuízo aos profissionais.
O Crea Convida será transmitido ao vivo, a partir das 19h, pela TV Crea-PE, no YouTube. O programa tem apresentação quinzenal. Depois da apresentação dos palestrantes, será aberto um espaço para interação com os participantes da live. Será possível fazer comentários e perguntas sobre o tema pelo chat do canal do Crea-PE.